Marina Ibaldo - 2017/2
Eu não gosto da minha pele. Eu me sinto invisível com essa cor café-com-leite que não é branca, mas não é negra. Desde sempre isso me incomodou, como quando diziam que eu ficava feia ou até vulgar por usar vermelho, fosse nos lábios ou nas roupas, ou quando eu não podia falar de racismo por “não ser negra o suficiente”. Isso sempre me fez um mal terrível - como se eu fosse aquela última a ser escolhida nas aulas de educação física, não por ser estranha, mas por não ser ninguém. Eu só fui entender o porque me doía tanto quando eu passei a ver além dos “porque não pode” que minhas amigas usavam como resposta após diversas indagações de por que eu não podia alisar o cabelo sem ser considerada artificial, nem deixá-lo cacheado pois não era “pra mim”. Como se existisse cabelo “pra mim”, roupa para negra e roupa para branca, cor de mulher ou de homem.
O que também nunca entrou na minha cabeça foi a frequente diminuição do que eu dizia quando eu questionava um posicionamento político - com o objetivo de compreender e não criticar- e as pessoas ao meu redor ficavam com aquela cara típica de preocupação tentando entender por que eu estava perguntando aquilo. Isso tudo porque não era esperado que uma mulher, ainda mais negra, tivesse opiniões e quisesse argumentar sobre o que as coisas eram ou não. Ao mesmo tempo, quando eu não sei algo, isso é normal, porque mulher não sabe de nada e negra, ou melhor, mulata, sabe menos ainda. O que se imagina de uma mulher da minha cor não é que ela tenha cérebro, mas sensualidade e nada mais.
Quando esperam que eu seja sensual, também esperam que mulheres negras sejam fortes, ou que asiáticos seja inteligentes, ou até mesmo que homens que usam dreads sejam sujos. Essas expectativas dos outros sobre nós nos prendem e nos forçam a seguir caminhos que nem sempre são os que desejamos, mas os que as pessoas ao nosso redor imaginam que sejam ao certo. O que essas pessoas não percebem é o quanto costuma ser gratificante quando tomamos nossas próprias decisões sem nos basear em suas expectativas, mas em nossos desejos. É como se quando mais fôssemos forçados a nos vestirmos como os outros querem, mais sentimos aquela vontade de vestir o que ninguém espera, só para “ver se fica bem”.
Antes mesmo de eu saber quem eu era ou de que cor eu era, todos ao meu redor já sabiam como esperavam que eu fosse e como eu deveria me vestir e agir. Eu não era a negra que serviria como empregada, nem a branca que serviria de esposa, eu era a “mulata” cor de café-com-leite que seria sensual como a mulher em um filme de ação, mas nunca esperariam que eu fosse a mulher do filme de ação porque eu não era branca o suficiente para isso. Como eu não era feminina como uma “mulata”, nem sensual como uma, mais uma vez, as minhas atitudes e personalidade faziam com que as expectativas sobre quem eu deveria ser, de acordo com o meu tom de pele, fossem derrubadas uma a uma sem que eu nem estivesse me esforçando para alcançá-las. Eu não queria ser a moça da cor do pecado que todos esperavam, eu só queria ser eu.
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